“A prevenção é o mais eficiente, mais barato, mais fácil e mais indolor método de tratar uma queimadura”. A informação que você acabou de ler foi retirada da primeira página do manual elaborado pela Sociedade Brasileira de Queimaduras (SBQ). Conforme a entidade, em torno de 1 milhão de pessoas sofrem acidentes com queimaduras a cada ano no Brasil. Em 80% dos casos, os acidentes acontecem na própria casa da vítima.

Outras estatísticas trazidas pela SBQ acendem o alerta para a gravidade da situação: a cada 10 vítimas de queimaduras, quatro são crianças. De acordo com dados do Ministério da Saúde, apenas no ano de 2019, 21.023 crianças de zero a 14 anos precisaram ser hospitalizadas no país em razão desse tipo de acidente.

Classificadas em 1º, 2º e 3º graus, conforme sua gravidade, as queimaduras podem ser definidas como feridas traumáticas causadas por agentes térmicos (calor ou frio), químicos (produtos tóxicos) e elétricos ou radioativos (como o sol, por exemplo). A queimadura por calor é a mais comum e, em caso de acidentes domésticos, a cozinha é o espaço que mais reúne riscos.

Segundo a médica especialista em cirurgia plástica Dra. Ione Vargas, que tem vasta experiência no atendimento de pacientes queimados, a água quente é a causa mais frequente das lesões, tanto em crianças quanto em adultos. Ela alerta:

“Criança pequena deve ficar no cercadinho ou, então, os pais podem instalar um portão isolando a cozinha. Não use toalhas de mesa *(para evitar que as crianças puxem e, com isso, sejam atingidas por objetos quentes)*. Use jogo americano ou outro item a que a criança não tenha acesso.”

A médica também aconselha cuidado redobrado com fios elétricos e cabos de panela, que devem permanecer sempre virados em direção ao centro do fogão. Ao sentir cheiro de gás, não acenda a luz, porque a faísca pode incendiar o ambiente.

Apesar de mais perigosa, a cozinha não é o único espaço que merece atenção, como ensina a cirurgiã:

“Nunca abra o radiador do carro, se ele ferver. A água fica em estado de vapor e espirra para todo o lado.”

Os principais agentes causadores

– Superfícies ou líquidos superaquecidos;
– Fogo, incluindo chama do fogão, fogueiras e lareiras;
– Álcool, gasolina, produtos de limpeza inflamáveis;
– Fios elétricos, tomadas de luz, eletrodomésticos;
– Fogos de artifício, bombinhas, foguetes;
– Radiação solar;
– Frio;
– Postes;
– Soda cáustica.

O perigo do álcool

Em tempos de pandemia, o uso de álcool para higienização de superfícies e objetos se tornou parte da rotina de muitas famílias. As ações para combater o coronavírus ainda são necessárias, mas isso não quer dizer que não devemos ter cuidado com o uso da substância, que é altamente inflamável. Atenção ao manusear álcool, especialmente se houver uma chama por perto ou se a intenção for justamente usá-lo para acender o fogo. Se usar álcool gel nas mãos, aguarde no mínimo dois minutos antes de lidar com fogo ou fogão. A recomendação é do Corpo de Bombeiros Voluntários de Nova Petrópolis.

Conforme especialistas, os tipos de álcool mais indicados para a limpeza dos ambientes são o de 46º ou 54º. Eles são menos voláteis e mais seguros, uma vez que contêm mais água em sua formulação. Evite o uso de álcool para acender o fogo do churrasco.

E, claro, crianças e adolescentes não devem ter acesso livre ao produto; por isso, a dica é mantê-lo em locais altos e seguros.

Sofri uma queimadura. E agora?

Em casos mais leves, você pode colocar a parte lesionada debaixo da água corrente fria (com jato suave) por cerca de dez minutos, ou até aliviar a dor. Dra. Ione diz que, se for uma leve encostada na panela, aplicar maionese ajuda a diminuir a dor, mas o desconforto costuma voltar dentro de 20 a 30 minutos. É o tempo de tomar um analgésico simples.

O mesmo não vale para queimaduras mais severas. Nesse caso, a médica recomenda colocar uma toalha seca sobre o local e procurar o serviço de urgência. Outras dicas são:

– Não molhe, porque a água resfria a região e causa ainda mais dor;
– Se estiver distante do centro médico, utilize toalha úmida, mas em pequenas extensões;
– Não aplique produtos sobre a lesão e evite tocá-la com a mão. Se tiver bolhas, não tente estourá-las;
– Em caso de tecidos ou corpos estranhos grudados sobre o local, não tente descolar. Deixe os procedimentos para a equipe médica, que está treinada para agir da melhor forma.

Inverno combina com calorzinho, mas atenção…

Nos dias gelados, nada como um fogão a lenha, não é mesmo? Lençol elétrico, bolsa de água quente… São ferramentas que espantam o frio e trazem mais conforto para as nossas casas. No entanto, na mesma medida em que representam comodidade, o fogo, o lençol elétrico e a bolsa de água quente (ou até garrafas PET com água quente) trazem, também, um risco. A dica da Dra. Ione é substituí-los, se possível, por sistemas de aquecimento mais seguros, como a calefação. Outra ideia é apostar nos tecidos de microfibra ou em óleos que aquecem os pés.

Consciência previne acidentes e salva vidas

Como Dra. Ione lembra, o fogo e o calor são parte importante da evolução humana. Presentes na fabricação de produtos essenciais, no cozimento de alimentos e no aquecimento dos ambientes, eles não podem ficar de fora da nossa vida. Nossas condutas com relação aos riscos, entretanto, podem (e devem!) mudar.

“O mais importante é a consciência de que o fogo está presente na cultura humana e que é uma força da natureza a ser respeitada. É o que mantém a tecnologia e o conforto, se conduzido com responsabilidade”, finaliza a especialista.